O ELO PERDIDO DA MÚSICA ELETRÔNICA?

 

            Eu não sou jornalista, nem crítico de música, nem músico, nem fã número 1 de música eletrônica. No entanto, gosto muito de música (especialmente MPB), coleciono vinis e sou fã de alguns artistas de música eletrônica, como Kraftwerk ou Daft Punk. E alguns anos colecionando discos me trouxe algum conhecimento. Acontece que, tentando superar a crise que deve ter diminuído a qualidade de vida de todos os brasileiros, concluí que, além de comprar discos, eu também poderia vendê-los. A ideia original era sacrificar alguns dos meus favoritos que eu sabia que valeriam mais, mas resolvi começar por alguns que eu tinha repetidos ou de que eu não gostava tanto. Foi então que descobri que tinha uma fortuna dentro de casa e comecei timidamente a ganhar um dinheirinho vendendo disco. Dinheirinho suficiente até para comprar mais discos, tanto para revender quanto para guardar.

                Neste processo, que eu não vou detalhar aqui, acabei com uma cópia de um vinil que me surpreendeu muito. E é disso que se trata este artigo. O disco chama-se House of the Rising Sun (Casa do Sol Nascente), de uma banda chamada Hot R. S. Você mesmo já deve ter percebido que HOTRS são as iniciais justamente de House of the Rising Sun. O curioso, no entanto, é que Hot R. S., o nome da banda, em inglês, soa exatamente como hotter ass, ou seja, algo como bunda mais quente. Pois bem.

                Hot R. S. é tipo uma banda-fantasma. Lançaram somente alguns singles e quatro LPs. Nunca fizeram shows, nem fotos promocionais, nem apareceram na televisão. Os integrantes da banda sequer aparecem nas capas dos discos. A banda tem origem na África do Sul e seus integrantes originais contam com um clarinetista chamado Dan Hill e um percussionista e produtor chamado Kevin Kruger. Não há na internet quase nada de informação nem sobre a banda, nem sobre seus integrantes, nem sobre o álbum em questão. Este álbum, House of the Rising Sun, o primeiro da banda, de 1977, apesar de ser mesmo um álbum, tem apenas três faixas: o lado A traz a faixa com mesmo título do álbum, House of the Rising Sun, com 14min, e o lado B tem duas faixas de 7min cada: Slow Blow e Delta Queen. E é um álbum de disco music.

                Pelo que eu entendi, a faixa-título é um tema antigo, talvez do século 18, e ganhou diversas versões em diferentes gêneros musicais. E o disco todo me espantou pela modernidade em diversos aspectos. O primeiro deles que posso citar aqui é justamente o fato de ser uma banda “fantasma”. Em 1977, Kraftwerk estava lançando Trans Europe Express e ainda não havia se transformado em robôs. Daft Punk e seus sucessores nem tinham nascido ou usavam fralda. E, no entanto, a banda Hot R. S. já anunciava uma das tradições mais fortes da música eletrônica: a impessoalidade. Antes de Kraftwerk virar robô e bem antes de Daft Punk fazer o mesmo, o álbum House of the Rising Sun já estava lá e até hoje ninguém conhece a cara dos músicos do álbum.

                Outra modernidade do álbum é, apesar de ser um álbum de disco music, a batida muito forte, muito mais parecida com a batida da música eletrônica atual do que propriamente com a dos hits da disco music. Isso em 1977! Na África do Sul! No final da faixa-título tem até uma mulher gemendo como quem tem um orgasmo, coisa que eu só vim conhecer na famosa French Kiss, de Lil Louis, de 1989. O LP, aliás, tem um som excelente! Limpo, claro, forte e sem distorções acidentais. O estéreo também é ótimo e bem moderno.

                Bom, como eu disse, eu não sou especialista no assunto. Não garanto as informações que passei aqui, até porque elas são poucas na net. O que eu sei, no entanto, é que tenho um álbum incrível nas mãos, moderno demais, bom pra caramba e, sinceramente, surpreendente. Também não sou jornalista nem escritor profissional. Portanto, esse artigo, na verdade, é um artigo de impressões pessoais, o que tornaria o seu título, no mínimo, suspeito ou exagerado. No entanto, eu sinceramente acho que não. E acho que mais gente devia conhecer essa obra-prima.