DOIS ÁLBUNS DIVINOS!

            Jacob do Bandolim (1918 – 1969) foi um incrível compositor carioca venerado até hoje por qualquer grande artista da nossa música e cujo nome fez história na música popular brasileira. Compositor de choros clássicos, como Assanhado, Doce de Coco e Noites Cariocas, Jacob, além de compositor, também tocava bandolim e violão e, em 1964, fundou o fabuloso conjunto de choro Época de Ouro.

O Época de Ouro, existente até hoje, é um grande conjunto musical de choro que teve grande atuação e sucesso nos anos 1960. A partir dos anos 1970, esteve intimamente envolvido com Paulinho da Viola no projeto de não deixar o choro brasileiro desaparecer. Nos anos 1990, além de Paulinho, o Época acompanhou Marisa Monte, Elba Ramalho e Ivan Lins. Nos anos 2000, mais parcerias memoráveis: João Bosco, Martinho da Vila, Beth CarvalhoZeca PagodinhoNey Matogrosso, Ivan Lins, Paulinho MoskaArlindo Cruz e Leila Pinheiro, além de grande sucesso, inclusive de vendas de CDs, no país que, no mundo, talvez seja, curiosamente, o que mais admira a música brasileira, além de estar exatamente no lado oposto do planeta: o Japão.

O Zimbo Trio existe até hoje, com dois de seus integrantes originais. É um importante trio de baixo, bateria e piano. Foi o conjunto oficial dO Fino da Bossa, histórico programa de televisão apresentado pela grande Elis Regina em 1965, na TV Record, acompanhando a apresentadora-cantora e os seus convidados. Aliás, o CD triplo com trechos de apresentações desse programa é uma grande história à parte.

A divina Elizeth Cardoso (1920-1990) foi uma estupenda cantora brasileira, dessas que rompem barreiras entre rótulos (choro, samba-canção, bossa nova...), que sempre imprimiu personalidade no canto, tudo isso sem deixar de ser uma grande e elegantérrima cantora, daquelas que não precisam de artifícios para preencher completamente um palco, uma canção, uma plateia, um coração. Aliás, foi Elizeth quem oficialmente “inaugurou” a bossa nova, com o disco Canção do Amor Demais, mostrando Chega de Saudade, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes, pro mundo e sendo acompanhada por ninguém menos que João Gilberto ao violão.

Conseguiu sentir o peso da turma? Agora junta isso tudo num álbum.

Em 1968 isso aconteceu, para a alegria dos apreciadores da riquíssima música popular brasileira, em um show gravado ao vivo (e lançado em dois LPs) no Museu da Imagem e do Som (conhecido pela sigla MIS) do Rio de Janeiro. O show era justamente para arrecadar fundos para o Museu e os LPs foram lançados pelo MIS. Algumas faixas são instrumentais, mas a maioria reúne Elizeth e os músicos apresentados acima arrebentando e fazendo a plateia se emocionar e se tornar parte do espetáculo, cantando, aplaudindo e reverenciando a catarse que deve ter sido aquela noite. Tudo registrado nos LPs.

Algumas faixas que merecem destaque:

A associação de técnica e emoção na canção Derradeira Primavera, de Tom Jobim e Vinícius de Moraes, é inesquecível, mesmo para quem ouviu a gravação uma vez só. Uma prova de que o apelido divina não colou à personalidade da cantora à toa. As notas difíceis da melodia saem perfeitas e, como poderia dizer um músico americano, ao mesmo tempo cheias de soul.

Mulata Assanhada, de Ataulfo Alves, é divertidíssima, com acompanhamento (ou seria um dueto?) do bandolim do Jacob. Elizeth brinca com a divisão do ritmo e com a dinâmica (alternância entre notas com mais volume – forte – e notas com menos volume – piano), sem perder o rebolado jamais.

Em Barracão, Elizeth convida a plateia para acompanhá-la cantando a melodia e o momento é, sem dúvida, um dos mais emocionantes da história do disco no Brasil. Dá para sentir a energia da plateia seguindo a deusa que os encanta com seus poderes mágicos através da sua voz (perdoem-me as metáforas apelativas, é que não sei como dizer isso sem diminuir o valor da gravação usando palavras mais objetivas, tem nada de objetivo ali).

Ouvir a consagrada Noites Cariocas, do Jacob, executada pelo próprio, ao vivo e com maestria, já seria presente suficientemente bom para fazer valer os dois álbuns. E estou falando de uma faixa só.

Serenata do Adeus, do Vinícius de Moraes, é apresentada à capella (sem acompanhamento, só voz) e eu mal sei o que dizer sobre essa gravação. Só que é linda. Mais nada. A mais pura beleza de uma obra de arte emocionante.

            A doce Carolina, do Chico Buarque, é aqui apresentada integralmente instrumental e depois com a letra cantada por Elizeth. Um primor.

            Mas não se enganem: todas as faixas são igualmente excelentes, só comentei as minhas favoritas para não parecer que não tenho nada pessoal a dizer sobre elas, porém sem deixar o texto longo demais. A verdade, no entanto, é que talvez não seja possível explicar o que exatamente forma a “aura” que os apreciadores de arte de verdade podem enxergar nesses dois discos. Talvez seja só arte mesmo. Sem muita explicação.






Comentários

  1. O cara fala de disco de vinil e tem um 3 X 1 National......................

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    1. Que eu comprei com meu dinheiro e adoro. Quer me dar um melhor, Antunes Carlos?

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    2. Anderson, acho que ele quis dizer que tinha de ter a imagem de um vinil, não de um 3x1national áque inclusive ja tive e é excelente, ainda quero comprar outro desse.

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    3. Eu sei o que ele quis dizer, mas obrigado. Também gosto muito.

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